26 de jun. de 2011

A Nova Educação

A burguesia havia se tornado inimiga da Igreja, por pretender realizar os seus negócios sem a interferência desse “sócio” de má fé, que sempre estava disposto a apropriar-se dos melhores bocados, mas era aliada, na medida em que via na nela um poderoso instrumento para inculcar nas massasoperárias a sagrada virtude de se deixar tosquiar sem protestos.

A escola laica que resultou desse conflito estava, portanto, muito longe de ser revolucionária: ela pretendia tão-somente regulamentar o ensino religioso ministrado nas escolas, de modo a evitar conflitos no seio de uma instituição que era freqüentada por burgueses pertencentes a vários credos.

“Quando observamos, estrita neutralidade – acrescenta – e é necessário que não se lhe oponha o menor impedimento, ninguém tem o direito de queixar-se. Os escolares têm as suas horas leigas e as suas horas religiosas. Não se introduziu na sua existência qualquer perturbação”. ERNEST LAVISSE
“porque não atendia às necessidades de toda a população segundo idade, situação escolar e tendências”. CARLOS SAAVEDRA LAMAS declarando que o nosso sistema atual de educação era inepto.
Formar uma aristocracia operária, arrivista e dedicada é uma das intenções mais claras do ensino popular dentro da burguesia. Ao invés de confessar que as crianças que abandonaram a escola primária são as mesmas crianças que a burguesia obriga desde cedo a trabalhar para ajudar a manutenção de um lar que essa mesma burguesia destruiu previamente, prefere-se jogar a culpa sobre os “desgranados escolares”, para usar a expressão com que se começa a designá-los, sobre a insuficiência dos programas, sobre a dificuldade do ensino, sobre a rigidez dos horários.

A burguesia não se teria apressado a culpar os programas e os métodos escolares por esse fato, se ela própria já não tivesse, há tempo, reconhecido a necessidade de reformá-los. Essa necessidade se tornou mais visível nos últimos anos e engendrou entre os técnicos em pedagogia uma proveitosa frutificação de “sistemas” e de “planos”. É, dentro da nova educação, a corrente que poderíamos chamar “metodológica”.

A Corrente Metodológica pouco se preocupava com teorias, mas era muito interessada em realidades, a corrente metodológica, através das suas diversas expressões – Plano Dalton, Plano Howard, Técnica Winetka, sistema Montessori, Sistema Decroly – constitui, no fundo, a racionalização do ensino. 

Mas, ao lado dessa corrente silenciosa e calma, surgiu outra corrente turbulenta, que sem desconhecer a urgência de uma reforma didática, afirma que o núcleo do problema não está nisso e sim no aspecto cultural.Eis então, a corrente doutrinária, que buscava educar, para ela, não seria reformar este método ou corrigir aquele horário, mas, sim “mergulhar uma alma no seio da cultura”. 

Olhando para o futuro, ela pretende superar o presente e substituir as formas atuais por outras formas que permitam a livre atuação da personalidade humana.

"essa corrente acredita que é urgente transformar a escola e modificar por seu intermédio à sociedade." WYNEKEN
“Bases Para Fundar a Rapidez do Ensino, com Economia de Tempo e de Fadiga” COMÊNIO Capítulo XIX, Didática Magna (1657)
Em 1900 surge a “nova didática”, com iniciadores familiarizados com a alma infantil por meio da Antropologia, Psiquiatria e trabalhos laboratoriais: Binet, Declory, Montessori, Dewey, Claparède. Em substituição ao malbarato de tempo e de esforço que as velhas técnicas traziam consigo – soletração, memorização, fragmentação do ensino – a nova técnica se propunha aumentar o rendimento do trabalho escolar cercando-se à personalidade biológica e psicológica da criança. Surge daí a parte da nova educação que ataca a rigidez dos velhos programas, a tortura dos horários inflexíveis, dos exames desnecessários.

Para Ponce a burguesia se mostrou como monopolista, religiosa e fascista, a burguesia contemporânea não só renunciou ao ensino leigo por que havia batalhado tantos anos, como impôs à escola um tão ostensivo caráter de instrumento a serviço do Estado, que a criança italiana e a alemã não são mais do que futuros soldados do fascismo. 

O pensamento da burguesia contemporânea a respeito da “nova educação”: não lançar às massas as flores da cultura, e reservar apenas para o homem das classes superiores 

“o completo desenvolvimento do espírito”.

Sabemos o que significam as mãos da burguesia “liberdade da criança”, “formação do homem”, “direitos do espírito”. A imagem do novo homem que a burguesia nos prometia é a velha imagem já bem nossa conhecida: a de uma classe opressora que monopoliza a riqueza e a cultura diante de uma classe oprimida, para a qual só é permitida a superstição religiosa e um saber bem dosado. 

A escola da burguesia não pronuncia jamais uma só palavra que não sirva aos seus interesses, a escola do proletariado também quer defender os seus interesses; mas há uma grande diferença nessas duas posições: enquanto aquela apenas encarnava os interesses de uma exígua minoria, esta defende as aspirações das grandes massas trabalhadoras.

Os filhos dos proletários e dos camponeses russos vão à escola para se unir à vanguarda consciente do proletariado e para acelerar desse modo à construção do socialismo. 

A “nova educação” significa, pois, um ideal bem preciso para o proletariado. Este, portanto, apressou-se em construir um novo tipo de criança: a criança que serve aos interesses da única classe social que, ao invés de perpetuar-se como tal, aspira a destruir as classes sociais, para libertar a sociedade.
  
Entre o fascismo da burguesia e o socialismo do proletariado, a “nova educação” aspirava criar uma educação que nada tivesse  ver com essas tendências políticas

Entre a burguesia que caminha para a morte e o proletariado que sabe com igual certeza que os destinos da humanidade estão em suas mãos, existe outra classe social, que nunca sabe com certeza o que deseja. Atraída, ao mesmo tempo, pela burguesia e pelo proletariado, a pequena burguesia constitui uma classe indefinida, indecisa e vacilante. Esmagada pela grande burguesia, a pequena não desaparece de acordo com uma linha gradualmente descendente. A força que a oprimi é a produção em grande escala, que desaloja periodicamente os pequenos capitais: maus tempos que fazem, então, do pequeno – burguês, um proletário. A força que a eleva é a desvalorização periódica do grande capital, motivada pelo envelhecimento das máquinas e das técnicas.   

PONCE, A. Educação e luta de classe. São Paulo: Cortez Editora e Autores Associados, 1981. (Capítulo VII e VIII)
Escrito por Izabela Moreira Alves.
 

Ficou curioso querendo saber mais de onde saiu a ideia socialista de PONCE?
Recomendamos a leitura de O Manifesto do Partido Comunista, escrito por Karl Marx.